22 de maio de 2010

Vittorio

Um dos grandes trunfos da humanidade é a festa open bar. Melhor que festa open bar, é festa open bar de uma certa categoria da sociedade. Melhor que isso, só se a categoria for o CREA.
Eis que, achei conveniente me infiltrar. E como foi.

* 1 *

Fazer amizades é bem fácil, quando as pessoas são movidas ao desespero por beber mais que seu colega ao lado. Fiz uma amiga ótima. Seu nome era com Z, pouco convencional, porém sou incapaz de lembrá-lo. Lembro bem que seus olhos lacrimejavam e seu lápis preto se desfazia. Ela usava all star vermelho, o que é bem subversivo, sendo a festa do CREA. Ela também fazia acrobacias e firulas que pareciam coreografias de pinguins cheirados. Isto é subversivo em qualquer classe. E claro, ela falava. E como falava.
E como boa tia velha malucona, ela tinha um filho. E eu, tendo menos de 40, parecia ser interessante ao filho dela, que sequer estava lá, sequer tinha como controlar a mãe. E quem é que tem, não é mesmo? Eis que minha amiga Z., além de lacrimejar e fazer coreografias, resolveu vender seu filho no estilo polishop - falando sem parar. Mas o menino era ótimo mesmo, exceto por um detalhe: fazia (além de direito) história. E olha que no vestibular ele fez pontos para passar para engenharia, como seu pai.
Tendo tanto em comum, eu e minha amiga não nos largamos mais. Ela urrava que queria mais cerveja pra mim e eu sorria para a platéia. Ela atacava criancinhas com seu afeto maternal, eu sorria para as mães. Ela era mesmo ótima.
Entretanto, mesmo diante duma amizade sincera e embasada em conceitos profundos, tivemos um conflito. Foi na hora que, na melhor das intenções, tentei evitar que ela derrubasse seu drink (de coloração suspeita, é bom informar) em si mesma, que Z. ficou furiosa. Sentiu-se intimidada, desrespeitada. Demonstrou isso ao mundo aos berros, dizendo "O QUE VOCÊ QUERIA? QUERIA MINHA BEBIDA? EU SEI QUE SIM! AGORA BEBE, BEBE!". Bebi, afinal eu faria qualquer coisa para salvar nossa relação. Era vodca. Era vodca e um pouquinho de limão. Limão e traços de coca cola. É válido também, lembrar que a festa era open bar e não serviam vodca. Concluí o óbvio: minha amiga era ótima, pra se guardar no coração.
Enquanto minha vida mudava, meus chefes conversavam. Diziam que Z. era considerada maluca, mas muito bem relacionada. Diziam que não iriam me salvar socialmente. Eu que me entendesse com ela.
No fim da nossa intensa amizade, resolvi atravessar as barreiras e perguntar o nome do seu maravilhoso filho. Constantino, respondeu ela. Argumentei que seria bastante previsível o gosto de seu filho por história, já que seu nome era este. Ela respondeu que não gostava da ideia dele fazer história ainda assim. Mas ele fazia o que queria, afinal, era o próprio Constantino.
Moral da história? Salvei minha filha de se chamar Maria Antonieta.

*2*

Da série grande ideias que salvaram a humanidade, achei conveniente, apesar de estar bêbada como uma porca (ou talvez por isso), montar no touro mecânico. Na fila, várias pessoas, de cinco anos de idade. E eu, de salto e muito blush na cara. Vergonha, nenhuma. Comecei a conversar com o senhor que controlava o touro. Quem não controlava mais nada era o meu lobo frontal. Eu disse que conhecia bem aquele boizinho, afinal, já tinha trabalhado em festas em que ele (o boizinho) estava. Disse que sabia muito bem que haviam várias velocidades e pedi que ele não me sacaneasse. E lá fui eu, de sainha xadrez, mais louca que o Batman, montar no touro. Que bela ideia! Os pais das criancinhas filmaram. O namorado da chefe disse que minha calcinha branca estava ótima, em clara menção a minha performance. Desci, considerando minha atuação quase pornográfica, ótima. Fui pra fila da pipoca e sorri desmioladamente, atropelei crianças, peguei pipoca antes delas e pensei "que mundo, hein".

*3*

Estava disposta a criticar todos. É pra isso que aceito ir em festas que se customizam camisetas. As cougars estavam por todos os lados. De paetês e aplicações de borboletas de strass. Era o terror do repertório visual. Eu sou má, meu coração é preto. Deus irá se vingar de mim.
Certa hora da festa, cansadas de tanto falar das pessoas, eu e minha chefe fomos ao banheiro. Sendo o banheiro um grande container, preferi ficar na salinha antes do mesmo. Sentei e chegaram as moças de 60, com seus paetês. Sorri cinicamente. Elas disseram que eu estava ótima, mas também, eu sou novinha, então é tão mais fácil. Foi um golpe baixo. Eu falei mal delas e elas me provaram que em alguns anos, caso eu não morra, estarei usando borboletas e paetês.
Elas começaram a tirar fotos no espelho do banheiro. Nada mais justo, considerando que os velhos são bebês, nada errado com as senhoras de meia idade existirem feito adolescentes. E como o cinismo não era mais uma arma eficaz, resolvi sorrir desmioladamente e oferecer meus serviços de fotografia. Elas aceitaram. Minha chefe, que tinha aceitado o desafio do banheiro, já tinha voltado nesta hora. As senhoras de 60 foram do bem e chamaram minha chefe para tirar fotos com elas. Incentivei a chefe a ir, para não perder a oportunidade de sacanea-la. Mas eis que, em poucos flashs, estavam as duas moças de 60, a chefe e eu, tirando fotos. Adolescentes (estas, com 14 anos mesmo) nos olhavam, nos reprovavam. Mal sabem elas que também estão fadadas ao paetês. Que deus ajude estas ovelhas.

*4*

Cansada de tudo aquilo, daquela gente customizada, resolvi ser rebelde e ir embora. Saí a pé, já que nem bicicleta eu sei usar. Começou a chover e eu praguejei que aquela chuva perdurasse, que estragasse várias chapinhas das mocinhas da festa. E eu chutava pedrinhas, me molhava e tentava ajustar o foco da visão. Tentava também achar o ponto de ônibus. Mas o mundo, o mundo é lindo. Da névoa alcoólatra surgiu um carro prata e uma funcionária do CREA, que me ofereceu carona. Não respondi, abri a porta do carro e entrei. Ela conhecia meu chefe, viramos amigas. Me trouxe em casa. Coisa linda. Esta é a dica do dia: seja amarga e o mundo parecerá melhor com qualquer boa ação.

Obrigada a todos os envolvidos.

3 comentários:

Anna Paula Stolf disse...

"Fui pra fila da pipoca e sorri desmioladamente, atropelei crianças, peguei pipoca antes delas e pensei "que mundo, hein"."

pq estranho é o mundo, não nós né? :D

Anna Paula Stolf disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anna Paula Stolf disse...

eu não tava sabendo que tinhas voltado e nem sei tbm pq diabos vim olhar o teu blog do nada, mas eis que teu bom humor mal-humorado caiu como uma luva no meu último fim de semestre da faculdade! TKS :*